Quando foi adotado por nós – todos em casa foram favoráveis – ele chorava a toda hora, em especial à noite, quando a solidão falava mais de perto, e o assobio da cruviana lhe raspava as narinas semi-cobertas. Chorava, choramingava, e quantas vezes fui ao seu berço levar carinho ou reavaliar sua necessidade de alimentação. Pequenino, sempre se dirigia em minha direção, em detrimento de outros que no local estivessem.
O seu choro era facilmente decifrado por mim. Eu sabia claramente quando estava com fome, quando sentia frio, quando estava envolto em suas excreções, sólidas ou líquidas. Enfim, eu cuidava do pequenino com zelo e dedicação.
A preferência por mim e a satisfação por minha presença – fosse ao seu lado ou à distância, no alcance da visão – eram percebidas por todos em casa, às vezes provocando um certo desconforto. Sua inquieta alegria – vislumbrada no brilho de seus olhos – ao perceber minha presença enchia-me de satisfação. Quando ocorria de eu viajar, todos percebiam seu acabrunhamento e irritabilidade. Sumia o apetite e chegavam a indisposição e a anorexia.
Desse modo, eu e o pequenino fomos nos envolvendo em um forte envolvimento afetivo, para ciumeira de alguns membros da família.
Ontem, chegando em casa, à noitinha, uma surpresa. Ele estava na área de serviço, banho tomado, linguinha de fora, dentinhos à mostra, com aquela carinha de safado de todos os dias. Ao me ver, correu para minhas pernas e eu tive a nítida impressão de ouvir, com sua voz rouca de barítono aposentado: Papai…
Juro que tive essa impressão, e uma sensação paternal invadiu minh’alma, quase no limite do suportável.
Olhando para o pequeno buldogue campeiro, vieram-me à garganta duas palavras, abafadas pela autocensura: Meu filho…
Au, au…
Tradução: Lindo.
Parabéns.
By: Guilherme Cantidio on Janeiro 22, 2012
at 4:13 pm