Publicado por: Evaldo Oliveira | Junho 30, 2012

APOLÔNIO E SEUS AMORES IMPOSSÍVEIS

 

Apolônio sempre foi muito exigente. Por isso, seus casos de amor, além de raros, foram efêmeros. Exceção para seu namoro com Teregrácia, o grande amor de sua juventude, que lhe causara o dissabor de trocá-lo por Nicanor, um mulato magricela que todo mês passava em sua casa com novidades trazidas do Paraguai, que iam desde aparelhos para modelagem da cintura até rádios que funcionavam com energia solar. Figura macondiana, à Melquíades, sem a sabedoria e a grandeza do cigano.

Meses atrás, dirigindo-se para casa, Apolônio foi parado por um adolescente, que lhe entregou um pequeno folder, que sabia ser propaganda de algum produto. Pôs o papel no bolso e se dirigiu à padaria. Na hora de dormir, lembrou-se do papel e decidiu lê-lo: Atenção!!! Simpatias para o amor – três cartas de baralho impressas de cada lado da frase. No alto: DONA ADAMASTORA (havia uma roda dos signos no meio, entre Dona e Adamastora); logo abaixo: Nada na vida acontece por acaso. Tudo tem um porquê de acontecer. Seja qual for o seu problema, não se desespere. Dona Adamastora estará sempre pronta a lhe ajudar em seus problemas, tais como amor mal correspondido, vícios em geral, desemprego, casamento em crise, frieza sexual. Quer descobrir uma traição, receber uma dívida? Dona Adamastora traz a pessoa amada e grandes negócios na palma da mão. Amores mal correspondidos? Negócios vão mal? Quer fazer voltar a pessoa amada? Está perturbado, sem prosperidade? Sofre com o vício do alcoolismo? Problemas sexuais? Qualquer que seja o problema, com uma só consulta ela indicará os caminhos certos e seguros. Faz e desfaz qualquer tipo de trabalho. Não cobra trabalhos. Embaixo, em letras miúdas – Atenção: toda segunda-feira correntes positivas pelas 21 linhas brancas, com passes e defumações, rezas e benzimentos para abrir caminho, cortar olho grande, curas espirituais, nervosismo e insônia. Em seguida, o endereço e o telefone.

Apolônio quase não conseguiu dormir. Já estava com cinquenta anos, e precisava dar um rumo a sua vida. O problema era que Geracinda, uma cabrocha assanhada, não lhe dava a atenção que se deve dar a um vira-lata. No dia seguinte, sábado, ele iria conversar com dona Adamastora para discutir seu projeto amoroso.

Meio sem jeito, ligou e marcou a consulta. No local, achou a casa um pouco estranha, com forte cheiro de incenso. Na sala, figuras de bruxas e gnomos, e muitos gatos deitados em sofás com jeito de nunca terem sido lavados.

Abriu seu coração. Falou do seu amor por Geracinda e da frieza com que ela tratava seus olhares apaixonados e suas insinuações. A vidente, de fato, não cobrava pelos trabalhos. Mas exigia, para realização daquela trabalho especial, dinheiro para comprar quatro tachos de cobres novinhos, dois litros de um tipo especial de óleo, treze galinhas brancas, treze abóboras, muitas rosas – brancas e vermelhas – duas dúzias de velas brancas e duas grandes velas pretas, um binóculo pequeno, daqueles que são usados em teatros, perfume, além de outros itens que não conseguia lembrar. E foi aí que quase toda a poupança do velho funcionário evaporou.

Passaram-se cinco dias, uma semana, quinze dias… e nada. Geracinda continuava tratando-o com desdém. Não suportando mais tanta ansiedade, Apolônio foi conversar com a vidente. Esta, logo que o viu, em meio ao forte aroma dos incensos, foi logo falando:

– Seu Apolônio, foi muito bom revê-lo. Para concluir aquele trabalho, necessito de dinheiro para comprar uma jóia para a protetora da amarração. Essas divindades são muito exigentes, o senhor sabe.

E novamente Apolônio fez o desembolso da quantia solicitada. Só pediu um tempinho para ir a um caixa eletrônico, e logo estaria de volta com o dinheiro.

Dinheiro entregue, ficou no aguardo. Continua aguardando, só que agora ele mora bem distante, em um bairro da periferia. Barraco de dois cômodos, que ele mantém sempre limpinho.

E Geracinda? Só depois de algum tempo ficou sabendo que ela, dissimuladamente, havia fugido com o auxiliar de churrasqueiro que sempre aparecia em sua casa oferecendo carnês do Baú do Outro Mundo.

Apolônio riu meio sem jeito, e lembrou do Prof. Laércio Segundo de Oliveira, que dizia: Todo churrasqueiro tem direito a três coisas: ser chato, ter um ajudante e uma toalhinha para pôr no ombro.

Mas não de levar a mulher dos outros, resmungou.


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